Quem sou eu

Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Somos professores de língua e literatura clássica (Professor Matheus Trevizam - latim - e Professora Tereza Virgínia -grego) e uma aluna (Veronica Cabral) na Faculdade de Letras da UFMG. Como docentes, atuamos na graduação e na pós-graduação da FALE nas áreas do ensino, pesquisa e orientação científica a alunos.

domingo, 31 de maio de 2009

O gênero epistolar na antiguidade







O gênero epistolar e suas manifestações na Literatura Latina






Professor Matheus Trevizam






O que diferencia, como gênero literário, a composição de cartas de outras produções possíveis? Uma carta é, essencialmente, uma mensagem escrita direcionada de um remetente a um destinatário, que apenas cumpre por inteiro a própria função comunicativa com o envio e, sobretudo, a leitura. Independentemente de ser mais ou menos elaborada do ponto de vista linguístico, assim, uma epístola seria “falaciosa” caso não cumprisse este seu papel de meio comunicativo à distância: é o que se dá nas coletâneas escritas com vistas imediatas à publicação, sem que nunca os autores tenham, de fato, composto suas mensagens em resposta a alguma necessidade prática de se fazerem presentes in absentia...
Em si mesma compreendida, a escrita de cartas foi copiosa em Roma antiga: vários autores, de menor (Sidônio Apolinário, Aurélio Símaco, Paulino de Nola...) ou maior (Plínio, o Jovem, Cícero, São Jerônimo, imperador Trajano, Horácio...) expressão, legaram-nos recolhos epistolares provenientes da Antiguidade, por vezes bem volumosos (cf. 860 cartas que se atribuem a Cícero!). Nem em todos os casos, porém, como veremos pouco a pouco, pode-se ter certeza de que se trata de textos compostos com vistas ao pleno preenchimento pragmático da função epistolar.




sexta-feira, 29 de maio de 2009

Cartas - muito mais que simples correspondência

Hermes, o mensageiro dos deuses


Desde a Antiguidade, o correio é um dos mais importantes meios de comunicação. Percorrendo caminhos a pé, ou contando com cavalos e inúmeros postos para troca de homens e animais (como era o caso do correio persa, criado por Ciro, que chegou a contar com 2500 km. de abrangência), a necessidade de organizar a comunicação entre partes de uma mesma área é marca latente de sociedades organizadas e em expansão. Inicialmente orais, confiados exclusivamente à memória dos mensageiros, foi depois da invenção da escrita que os sistemas de correio tiveram seu crescimento.

Contudo, é o Império romano que dará a melhor organização na Antiguidade ao sistema de correios, tendo mensageiros do "cursus publicus" (como era chamado o correio imperial) percorrido entre 70 e 200 km. diariamente sobre o território.
E, como não podia deixar de ser, a carta torna-se um dos gêneros mais recorrentes depois da invenção da escrita. “Sagradas” (como as inúmeras cartas dos apóstolos), amorosas, políticas e até literárias (como as "Heroides" de Ovídio), as cartas despertam-nos a curiosidade de lhes conhecermos as entrelinhas.
E é sob os auspícios de Hermes, grande mensageiro dos deuses, que o “Nuntius notícias”, neste mês, traz o tema epistolar.
Lê-se um interessante texto sobre a história dos correios clicando clicando aqui.





quinta-feira, 14 de maio de 2009

Nuntius matérias - Livio Andronico e a épica traduzida

Lívio Andronico e os albores da Literatura latina



Prof. Matheus Trevizam



Imagem retirada do site"Bibliotheca Augustana"







Curiosamente, estabelece-se como marco inaugural da Literatura em Roma a “Odussia”, tradução para o latim da “Odisseia” homérica, empreendida na metade do terceiro século a.C. por Lívio Andronico. Esse, um escravo grego da cidade de Tarento, no sul da Itália, caíra nas mãos dos dominadores romanos após o cerco à sua pátria (272 a.C.), tendo sido levado ainda adolescente a Roma e, lá, adotado com o nome de família dos senhores (“Liuius”). Embora sua modesta versão de Homero tenha-se de início prestado a propósitos escolares (pois Andronico encarregou-se, em Roma, da educação bilíngue dos jovens da Cidade) e adotado o rude verso “satúrnio”, característico dos primitivos cantos itálicos, o tradutor conseguiu o reconhecimento nessa terra estrangeira; além disso, indubitavelmente lhe couberam assim os méritos de pôr uma ainda insipiente civilização romana em contato com os esplendores do passado grego.
É antológico, de Andronico, o primeiro verso da “Odussia”, que reproduz o início exato do poema homérico traduzido com a troca “aclimatada” da “Musa” inspiradora grega pela “Camena” itálica: “ándra, moi énnepe, moûsa, polútropon...” - “uirum mihi, Camena, insece uersutum” – “conta-me, ó Camena, do varão astuto”.




A imagem "Odisseu" e uma biografia do autor estão aqui. (Texto em italiano).





Respostas do exercício da 3ª declinação: Resposta: 1(i), 2(c), 3(c), 4(c), 5(i), 6(i), 7(c), 8(c), 9(i), 10(i), 11(c), 12(i), 13(c), 14(c), 15(i), 16(c).






Questão de Língua - Exercício de temas em “i” e consoante em latim (terceira declinação)



Depois das dicas para facilitar sua vida com a 3ª declinação, disponibilizamos um exercício para avaliar sua evolução neste quesito:



Dentre as palavras abaixo, marque com a letra “i” as que considerar pertencentes a este tema e com a letra “c” as que julgar pertencentes aos vários temas consonantais possíveis (em primeiro lugar, dá-se o nominativo singular e, em seguida, o genitivo singular de cada termo):

1- ignis, ignis ( ) 9- aedes, aedis ( )
2- mater, matris ( ) 10- nubes, nubis ( )
3- sutor, sutoris ( ) 11- imperator, imperatoris ( )
4- nomen, nominis ( ) 12- mare, maris ( )
5- ouis, ouis ( ) 13- latus, lateris ( )
6- nox, noctis ( ) 14- corpus, corporis ( )
7- lumen, luminis ( ) 15- piscis, piscis ( )
8- pater, patris ( ) 16- dux, ducis ( )


Respostas na próxima postagem...




Nuntius matérias: Ênio

Ênio e o amadurecimento da épica em Roma



Prof. Matheus Trevizam




Como dissemos na postagem anterior, teve-se no épico Ênio (séc. II a.C.) o maior poeta romano de assunto heroico até surgir Virgílio, com a obra nacionalista que foi sua “Eneida”. Sem, propriamente, ter “inventado” preencher o molde do gênero épico com temas da história pátria [o que coubera, ao que tudo indica, já a Névio (séc. III a.C.)], este poeta amadureceu tal forma compositiva e, sem dúvida, inovou-a. Assim, além de terem-se seus "Annales" num poema de grande fôlego (já que abrangentes, ao longo de dezoito livros, de toda a história de Roma desde sua fundação lendária), Ênio introduziu, nesta obra, o emprego dos versos hexâmetros na literatura latina. Dono de um estilo “impressionístico” (fortemente marcado pelo gosto intensificador das aliterações, jogos de palavras, epítetos heroicos, disposições motivadas de vocábulos, onomatopéias...), o autor, de que apenas nos restam em torno de 600 versos, é aqui exemplificado de leve pelas passagens seguintes:

“At tuba terribili sonitu tarantara dixit” – “Mas a tuba, com som terrível, ‘disse’ ‘tarantara’” ("Annales").


“Saxo cere comminuit brum” – “Com pedra, despedaçou os miolos” ("Annales", fr. 609) – note-se a “tmese”, quebra da palavra “cérebro” em duas partes, para ilustrar, visual e sonoramente, a ideia em jogo!



A imagem é de um mosaico do século III. Ela e um interessante texto sobre épica(em espanhol) você encontra
clicando aqui.



sexta-feira, 1 de maio de 2009

Nuntius matérias - a Épica de Lucano

Lucano e a épica histórica latina











(A morte de Lucano - de Jose Garnelo y Alda.
Para saber más sobre a vida do pintor,clique aqui.)




“e l'ultimo Lucano” (Dante, Inferno lV -90)


Professor Matheus Trevizam


Nem só de batalhas e amores, porém, sobreviveu a épica latina: em verdadeira mostra de sua capacidade inventiva,os romanos, profundamente impactados pelos modelos gregos, não deixaram de imprimir as próprias marcas culturais sobre esse gênero estrangeiro. Dessa maneira, em conformidade com o traço de sua cultura relativo ao respeito e valorização dos "maiores populi Romani" (“ancestrais do povo de Roma”), os latinos adaptaram de modo inédito temas de ordem histórica às narrativas épicas, o que se deu de forma bem documentada pelo menos desde o "Bellum Punicum" de Névio (séc. III a.C.) e, sobretudo, os "Annales" de Ênio (séc. II a.C.), o grande épico nacional até surgir Virgílio.
Especificamente, o jovem poeta imperial Lucano (Marcus Annaeus Lucanus, séc. I d.C.) realizou-se como autor da vertente épica histórica (e não mítica!) compondo sua "Farsália", em que se descrevem os eventos das Guerras Civis a oporem os partidários de Júlio César e Pompeu Magno (imagem a esquerda) no séc. I a.C.: o tema do fratricídio, a sangrenta violência de tantos episódios bélicos, a linguagem trabalhada ao extremo, de acordo com o gosto das escolas de retórica de sua época, a fuga às demasiadas intervenções dos deuses no mundo e o deslocamento motor da trama para as motivações psicológicas das personagens retratadas constituem, então, alguns traços característicos da dicção lucaniana. Uma das vozes mais curiosas da história da Literatura latina, Lucano teve a má sina de ver-se obrigado ao suicídio com apenas vinte e seis anos, pois o perseguiam implacáveis, como também sucedeu ao tio (o filósofo estóico Sêneca), os rancores do imperador Nero.
Disponibiliza-se a tradução integral (para o espanhol) da "Farsália" no site do Nuntius, e para acessá-la, clique aqui.