Como dissemos logo nas postagens introdutórias sobre o gênero epistolar, o que caracteriza propriamente uma carta é o pormenor de ser ela escrita visando a fins comunicativos de fato, isto é, com intentos de corresponder a um intermediário entre seu autor e um destinatário longínquo a lê-la para informar-se. Nesse sentido, o que se vê na coletânea denominada “Cartas das heroínas”, de Ovídio, não se enquadra bem na canônica definição epistolar: trata-se de quinze elegias, ou poemas escritos no metro “dístico elegíaco” da poética greco-romana, compostas sob a “forma aparente” de missivas endereçadas por várias heroínas míticas a seus amantes/ maridos. Ei-nos, portanto, diante dessa obra, confrontados com casais de sonho, a povoarem a literatura ocidental desde Homero (Penélope e Odisseu, Briseida e Aquiles, Dido e Eneias...), e cuja fictícia “comunicação” se deve apenas à arte de Ovídio. Como em geral se trata aqui de amores fadados ao fracasso ou a envolverem amantes separados no tempo e no espaço, muito do tom choroso da “elegia erótica romana”, de Propércio e Tibulo, perpassa o livro
“A ti, pedras, montes e carvalhos em altas penhas
nascidos, a ti geraram feras cruéis,
ou o mar, tal como ainda agora o vês agitado pelos ventos
e para onde, contudo, queres ir sobre ondas hostis.
Para onde foges? A tempestade proíbe. Valha-me o favor da tempestade!
Nota como o Euro revolve as águas revoltas!
O que preferira a ti, deixa-me dever aos vagalhões;
é mais justo o vento e o mar que teu coração".
Professor Matheus Trevizam
A imagem foi encontrada no blog "Leda y el Cisne". Um blog inteiramente dedicado a esse mito, onde podemos encontrar um interessante texto sobre as "Heroides" de Ovidio, lidas a partir de aportes sobre o mesmo tema. O texto está em espanhol.
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